quarta-feira, 26 de março de 2014

Jamais

deixe de escrever.
 Este é o único legado que deixamos quando morremos: a arte de expressar, por meio de palavras, o que nunca conseguimos dizer com o nosso corpo.

terça-feira, 18 de março de 2014

Jornalismo Afobado


Que o universo de produção jornalística exerce imensurável influência no cotidiano dos cidadãos do mundo inteiro, já não é novidade. No entanto, e cada vez mais, a prática do jornalismo consegue surpreender a todos com seu poder soberano e avassalador no âmago das sociedades contemporâneas: os mediadores das comunidades, - também chamados jornalistas -, vêm concretizando, de fato, o status de legetimadores dos acontecimentos sociais, por meio das diversas mídias que empreendem seus trabalhos. 
Jamais houve na história tamanha dependência com os meios de comunicação. Se os jornais impressos, a televisão e o rádio, já eram artefatos jornalísticos fomentadores da opinião do público, com o advento da Internet, então, os espectadores se viram obrigados, a velocidades estarrecedoras, a não mais formar opiniões, mas consumir um grande número de informações em escalas de tempo cada vez menores. Tais escalas enxutas são concomitantes com o novo trabalho do jornalista na Internet: a produção de notícias online e em tempo real. 
Assim, se nas mídias tradicionais, como em jornais, há mais tempo para a apuração e produção de notícias até o final do dia, nos portais virtuais, por outro lado, o jornalista tem de encontrar os furos de reportagem e as novidades em tempos minuciosamente estipulados e fragmentados para, em seguida, inserir na Internet essas mesmas novidades no tempo e hora que se sucederam com total exatidão. O imediatismo, intrínseco a essa nova forma de produção jornalística, gerou, no entanto, resultados não muito positivos no que concerne ao elo produtor-receptor de notícias.
Pois, o jornalista, pautado por um tempo ínfimo para finalizar uma matéria para a Internet, acaba se sujeitando, fatalmente, aos erros de apuração e veracidade jornalísticas. Como saber se aquela notícia é, de fato, verdadeira, considerando a agilidade com que foi abordada? Da mesma maneira, será que a população averigua se essa ou aquela informação é verídica ou não? As respostas a essas perguntas podem ser perfeitamente ilustradas, aliás, no documentário Abraço Corporativo, do jornalista Ricardo Kauffman. 
O personagem principal, Ary Itnem, é consultor de RH e representante da Confraria Britânica do Abraço Corporativo na América Latina. Com sua "teoria do abraço", o consultor tenta resolver a problemática da "inércia do afastamento", - resultado da carência de relações interpessoais nas empresas, devido ao excesso de tecnologias, - ao dar abraços nas pessoas que vê pelas ruas. Itnem, no entanto, é um falso consultor que trabalha em um grupo forjado, e a ideia de Kauffman era justamente esta: verificar se o impacto do personagem, que rendeu milhares de visualizações no youtube com seus free hugs, seria alvo das pautas jornalísticas.
E, de fato, foi. Nomes importantes do jornalismo como Heródoto Barbeiro acreditou cegamente no suposto consultor. Jornais como O Estado de São Paulo e O Globo foram alguns que noticiaram o caso como verdadeiro também. A partir da grande repercussão que Itnem causou nos grandes veículos de comunicação, nada mais justo do que representar a fragilidade da apuração e credibilidade jornalísticas em forma de filme: Kauffman quis mostrar, com sagacidade, o quanto as instituições jornalísticas carecem de profissionais experientes e aptos a discernir informações falsas das verdadeiras.
Além disso, há um fator proeminente que deve ser levado em consideração, - o jornalismo do espetáculo. Fazendo alusão ainda ao personagem Ary Itnem e a sua "história" impressionante, os jornalistas, juntamente com sua ingenuidade profissional, acreditaram na teatralização do falso consultor, pelo poder de persuasão e verossimilhança das cenas criadas. Desse modo, ao invés dos pauteiros checarem e rechecarem a veracidade, bem como a validez daquele desdobramento, optaram por divulgar um acontecimento que, aparentemente, pelo conteúdo imagético forte, lhes pareciam reais. E, hoje, nas sociedades capitalistas, a espetacularização de uma notícia equivale dinheiro.
Ou seja, os jornalistas vislumbraram, também, o quanto poderiam lucrar ao fazerem uma cobertura sobre o abraço corporativo. Afinal, é um tema inusitado que, além de acoplar entretenimento à curiosidade, possui tanto relevância pública quanto relevância do público. Resta saber, agora, qual será o futuro, definitivamente, do jornalismo: atender às grandes demandas populacionais com informações mal apuradas ou propagar informações com abordagens mais profundas, mais limpas, coesas e verdadeiras em seu entorno?
No mundo das tecnologias digitais, onde tempo é dinheiro, é cada vez mais difícil (re)estabelecer a ordem e a prudência dentro da redação e assessoria de imprensa, - cuja demanda de informação é tão grande quanto o tik tak acelerado do relógio. Não obstante, vale o otimismo do melhoramento e o incremento da prática jornalística que caminha, paulatinamente, sobre trilhos ainda desconhecidos de uma era tão turbulenta como o século XXI. 

quinta-feira, 6 de março de 2014

O tempo pautando os pauteiros

Por Juliana Taouil

But time, keeps flowing like a river (on and on)
To the sea, to the sea

"Mas o tempo sempre flui como um rio (sem parar). Para o mar, para o mar". Esse é um trecho da música Time da banda de rock progressivo inglesa The Alan Parsons Project. E, talvez, esses versos nunca fizeram tanto sentido quanto agora, em nossas sociedades hodiernas: o tempo, cada vez mais, escorre de nossas mãos em uma velocidade tão estupenda que, se não o agarrarmos com imediatismo e, ao mesmo tempo, com intensidade, ele se vai em um piscar de olhos.
É sobre este caráter efêmero do tempo que Vicente Romano Garcia, doutor em Comunicação Social pela Universidade de Münster, discorre em seu texto Ordem Cultural e Ordem Natural do Tempo. Segundo Garcia, vivemos um verdadeiro paradoxo vigente já no século passado. Se antes dispúnhamos de extensas e longas horas para trabalhar para o patrão, cujo tempo ocioso era notoriamente pífio, no mundo atual, por outro lado, dispomos de uma carga horária de trabalho muito mais enxuta, mas não menos sufocante, pois, apesar de hoje termos mais tempo "livre" para realizarmos outras atividades, essas acabam sendo pautadas pelo tik tak do relógio que, cada vez mais, nos mecanizam, sob a ordem social do tempo.
Ficamos, dessa maneira, extremamente dependentes de artefatos mediadores de tempo, - nossas vidas, mais do que nunca, jamais lograram postura mais submissa às novas mídias sociais como a Internet, para citar um exemplo. O desenvolvimento e incremento dos meios de comunicação se fazem intrínsecos ao processo de aceleração do tempo, como comentou o autor, "Na sociedade da alta velocidade o tempo mesmo se converte em objeto de aceleração" (GARCÍA, 2002). Por isso, como explicou o espanhol, estamos sujeitos à uma sobreposição de tarefas, como consequência desse tempo devorante e, não menos, devorador dos homens.
O ofício de Jornalista, aliás, é um exemplo ilustrativo desse novo panorama social e cultural do tempo: se há vinte anos ainda predominavam as mídias impressas e tradicionais como os jornais, hoje em dia, com o advento da Internet, os jornalistas tiveram de se adequar às rápidas velocidades inerentes a essas plataformas virtuais, cujas características centrais são a disseminação de conteúdos online e em tempo real. Assim, os mediadores de nossos tempos, vulgo jornalistas, se viram obrigados a propalar e a divulgar notícias nas "telinhas" dos monitores no menor tempo possível.
Essa condição imposta a esses profissionais gerou, no entanto, em resultados não muito positivos. Afinal, o jornalista (típico dos jornais), acostumado à produção de notícias de forma mais paulatina do que aquelas inseridas no portal virtual, teve de agilizar seu trabalho, bem como a apuração dos fatos a fim de inteirar o espectador sobre as últimas e mais frescas novidades do dia. E esse novo fazer jornalístico, de certa forma, é muito mais suscetível aos erros de apuração, - devido à pressa e ao curto período de tempo de propagar a notícia pronta à tona -, e cujo caráter perecível acaba sendo recorrente, na maior parte das vezes, da abordagem superficial que é dada à matéria típica da Internet.
Portanto, o tempo acaba sendo fator primordial e o ponto-chave de nossas vidas e cuja força pode ser visivelmente notada em áreas como a do Jornalismo: somos, em um ritmo abrangentemente asfixiante, tomados pelo tempo que, cada vez mais, nos obriga a realizar um número grande de atividades diárias no menor intervalo estipulado. Tornamo-nos, finalmente, escravos de nosso próprio tempo quando, na verdade, deveríamos nos emancipar de seu caráter impositivo e uniforme.
Vale, então, a reflexão decorrente desses novos processos socioculturais e socioespaciais que vêm alterando as percepções humanas sobre o tempo e sua própria condição de existência: como atrelar, bem como propõe Garcia, de forma saudável o tempo do relógio a nossas vidas, sem nos sentirmos prisioneiros dele? Ainda fazendo alusão à profissão de jornalista, e a Carlos Alberto Di Franco em seu artigo Jornal, Qualidade e Relevância publicado em 03/03/14 no Estadão, "O jornalismo impresso deve ser feito para um público de paladar fino e ser importante pelo que conta e pela forma como conta. A narração é cada vez mais importante." Assim como a narração é importante, tão mais relevante seria se aproveitássemos o tempo que temos em sua totalidade e intensidade,  não nos servindo como míseros seres correndo apenas contra ele, mas, sim, indivíduos que narram suas histórias através dos tempos.